Almas Gemeas IV

Poucas pessoas ousam afirmar que duas criaturas 
se apaixonaram porque se entreolharam. 
Mas é assim que o amor inicia, e apenas desse modo.
Victor Hugo



"O amor não é uma chama efêmera, 
nascida do encontro de dois corpos, 
é uma chama eterna nascida 
da fusão de duas almas ..."
                                            Nadja Feitosa

O amor é a atração celestial das almas e dos mundos, a potência divina que liga os universos , governa e  fecunda . Amor é o olhar de Deus ! Não designados sozinho com tais como a paixão ardente que agita o nome e o carnal deseja. Isto é nada mais do que uma imagem, uma caricatura grosseira de amor. amor é o sentimento superior de que se funde e se harmoniza todas as qualidades do coração, que é o coroamento das virtudes humanas , de ternura , de amor, de bondade , a manifestação na alma de uma força que eleva o significado do amor a alturas divinas , unindo todos os seres e despertando em nós a felicidade mais íntima que se desvia bastante de toda a luxúria .
Leon Denis

O Amor infinito de Pedro  e Inês de Portugal

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O AMOR DO infante Pedro, futuro rei de Portugal, com a dama de companhia Inês de Castro marcou a história e a cultura portuguesas.
Foi um amor proibido, vivido em atmosfera carregada de disputas de poder. A narrativa  baseia-se em registros históricos. Alguns detalhes pertencem ao campo da lenda, fruto da imaginação popular e do talento de artistas.

Auxilioemoional.blogspot.comInês de Castro
Rainha de Portugal (a título póstumo)
D.ª Inês de Castro (Reino da Galiza, ca. 1320/1325  Coimbra, 7 de Janeiro


Ines de Castro -Rainha pos morte

D. Inês de Castro,
«aquela que depois de morta foi Rainha»,
esposa de El-Rei D. Pedro I
Governo
Vida
Nascimento1320 ou 1325
Galiza
Morte7 de Janeiro de 1355 (35 anos)
Quinta das Lágrimas, Coimbra
SepultamentoMosteiro de Alcobaça
PaiPedro Fernandes de Castro
MãeAldonça Lourenço de Valadares





































Em 1320,  nasce o infante Pedro. Ele vivia no vale do rio Mondego, em Coimbra, então capital do reino. Das janelas do castelo real, avistava o mosteiro de Santa Clara, do outro lado do rio. Neste local enterram sua avó, Isabel de Aragão, então venerada como uma santa, um reflexo do grande fervor místico da Idade Média.
Outro dado do ambiente medieval europeu eram as constantes guerras causadas por disputas entre reinos. No caso, envolvendo tronos da Península Ibérica. Os arranjos políticos, por meio de casamentos entre nobres, eram parte essencial do jogo de poder da época.
Voltando a Pedro, não lhe cabia decidir o próprio futuro político e amoroso em tal conjuntura de manobras e alianças calculadas. Desde jovem, ele estava prometido a Constança Manuel, filha de um descendente de monarcas dos reinos de Aragão, Castela e Leão.                
Dom Pedro I
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Rei de Portugal

Auxilioemocional.blogspot.com
D. Pedro I de Portugal (Coimbra, 8 de Abril de 1320  Estremoz, 18 de 

Governo
Reinado8 de março de 1357 —
18 de janeiro de 1367
CoroaçãoLisboa
ConsorteD. Branca de Castela
D. Constança Manuel
D. Inês de Castro
AntecessorD. Afonso IV
HerdeiroD. Fernando I
SucessorD. Fernando I
DinastiaBorgonha
TítulosO Justiceiro
Vida
Nascimento8 de Abril de 1320
Coimbra, Portugal
Morte18 de Janeiro de 1367 (46 anos)
Estremoz, Portugal
SepultamentoMosteiro de Santa Maria,Alcobaça
FilhosVer descendência
PaiD. Afonso IV
MãeD. Beatriz de Castela






































Pedro não queria, mas se submeteu ao casamento. Constança lhe deu um herdeiro e outros dois filhos. Quanto ao amor, o príncipe foi buscá-lo em outra mulher, logo a dama de companhia de sua esposa. O nome dela era Inês de Castro, jovem de grande beleza, descrita como loura e elegante. Por esses atributos, era chamada de “colo de garça”.

Pedro e Ines de CastroA paixão do príncipe foi correspondida. Mas o nada discreto caso de amor incomodou a Corte. “O escândalo tomou tais proporções que a esposa, d. Constança, decidiu chamar Inês para ser a madrinha da criança que estava esperando, já que esse tipo de parentesco espiritual tornava impossível a união que se esboçava, mais intensa a cada dia”, escreveu a historiadora portuguesa Maria Zulmira Furtado Marques, em A tragédia de Pedro e Inês.
Como os amantes seguiam com o romance adúltero, o pai do infante, o rei Afonso IV, ordenou o afastamento de Inês. Ela deixou o país e se exilou em Albuquerque, em Castela. Mesmo separados, Pedro e Inês continuaram a trocar cartas inflamadas.
Em 1345, Constança morreu num parto, e o príncipe se viu liberto das amarras do casamento de conveniência aos 24 anos de idade. 



Depois de alguns anos no Norte de Portugal, Pedro e Inês tinham regressado aCoimbra e instalaram-se no Paço de Santa Clara. Mandado construir pela avó de D. Pedro, a Rainha Santa Isabel, foi neste Paço que esta Rainha vivera os últimos anos, deixando expresso o desejo que se tornasse na habitação exclusiva de Reis e Príncipes seus descendentes, com as suas esposas legítimas.
Havia boatos de que o Príncipe tinha se casado secretamente com D. Inês. Na Família Real um incidente deste tipo assumia graves implicações políticas. Sentindo-se ameaçados pelos irmãos Castro, os fidalgos da corte portuguesa pressionavam o rei D. Afonso IV para afastar esta influência do seu herdeiro. O rei D. Afonso IV decidiu que a melhor solução seria matar a dama galega. Na tentativa de saber a verdade o Rei ordenou a dois conselheiros seus que dissessem a D. Pedro que ele podia se casar livremente com D. Inês se assim o pretendesse. D. Pedro percebeu que se tratava de uma cilada e respondeu que não pensava casar-se nunca com D.ª Inês.
                  
Em 1347, Inês deu à luz ao primeiro de quatro filhos com o infante. 
Mas o povo comentava e condenava o adultério, enquanto 
a peste negra, considerada sinal da cólera de Deus, 
chegava à região. I
indiferentes a tudo, Pedro e Inês viviam seu grande amor.





 Fonte dos Amores, onde os amantes trocavam confidências,atualmente  é ponto turístico em Coimbra

Consta que ele a visitava a alguns passos de seu palácio, 
na Fonte dos Amores. O local ficava ao abrigo do sol
e possuía uma parede coberta de hera, aberta em dois arcos, 
propícia para o romance e a troca de confidências. 
A famosa fonte continua hoje a jorrar na quinta das Lágrimas, 
onde funciona um hotel. Assim, historiadores e turistas podem 
conhecer o local do mítico romance .

A 7 de janeiro de 1355, o rei cedeu às pressões dos seus conselheiros e aproveitando a ausência de D. Pedro, numa excursão de caça, foi com Pêro Coelho, Álvaro Gonçalves, Diogo Lopes Pacheco e outros para executarem Inês de Castro em Santa Clara, conforme fora decidido em conselho. Segundo a lenda, as lágrimas derramadas no rio Mondego pela morte de Inês teriam criado a Fonte das Lágrimas da Quinta das Lágrimas, e algumas algas avermelhadas que ali crescem seriam o seu sangue derramado.
A morte de D. Inês provocou a revolta de D. Pedro contra D. Afonso IV. Após meses de conflito, a Rainha D. Beatriz conseguiu intervir e fez selar a paz, em agosto de 1355.D. Pedro tornou-se no oitavo rei de Portugal como D. Pedro I em 1357. Em junho de 1360 fez a declaração de Cantanhede, legitimando os filhos ao afirmar que se tinha casado secretamente com D. Inês, em 1354, em Bragança «em dia que não se lembrava». A palavra do rei, do seu capelão e de um seu criado foram as provas necessárias para legalizar esse casamento.
De seguida perseguiu os assassinos de D. Inês, que tinham fugido para o Reino de Castela. Pêro Coelho e Álvaro Gonçalves foram apanhados e executados em Santarém (segundo a lenda o Rei mandou arrancar o coração de um pelo peito e o do outro pelas costas, assistindo à execução enquanto se banqueteava). Diogo Lopes Pacheco conseguiu escapar para a França e, posteriormente, seria perdoado pelo Rei no seu leito de morte.
D. Pedro mandou construir os dois esplêndidos túmulos de D. Pedro I e de D. Inês de Castro no mosteiro de Alcobaça, para onde trasladou o corpo da sua amada Inês, em 1361 ou 1362. Juntar-se-ia a ela em 1367. A posição primeira dos túmulos foi lado a lado, de pés virados a nascente, em frente da primeira capela do transepto sul, então dedicada a São Bento. Na década de 80 do século dezoito os túmulos foram mudados para o recém construído panteão real, onde foram colocados frente a frente. Em 1956 foram mudados para a sua actual posição, D. Pedro no transepto sul e D. Inês no transepto norte, frente a frente. Quando os túmulos, no século XVIII, foram colocados frente a frente apareceu a lenda que assim estavam para que D. Pedro e D. Inês «possam olhar-se nos olhos quando despertarem no dia do juízo final». A tétrica cerimónia da coroação e do beija mão à Rainha D. Inês, já morta, que D. Pedro pretensamente teria imposto à sua corte e que tornar-se-ia numa das imagens mais vívidas no imaginário popular, terá sido inserida pela primeira vez nas narrativas espanholas do final do século XVI.
O episódio inspirou o francês Henry de Montherlant a escrever, em 1942, a peça de teatro A rainha morta. Montherlant foi um entre muitos escritores, poetas e dramaturgos que se inspiraram na história. Celebre  Luís de Camões a recontou em versos em Os lusíadas.Também Garcia de Resende publicou, em 1515, suas Trovas à morte de Inês de Castro. Antônio Ferreira tratou do tema na peçaTragédia mui sentida de dona Inês de Castro, também no século XVI.
Pedro, ordenou a execução de dois túmulos (verdadeiras obras-primas da escultura gótica em Portugal), os quais foram colocados no transepto da igreja do Mosteiro de Alcobaça Pedro I também mandou esculpir sua história em detalhes no próprio túmulo. E quando ele morreu, em janeiro de 1367, seu corpo foi enterrado próximo da bem-amada. Os corpos não foram colocados lado a lado, como seria mais natural, mas um de frente para o outro, para que no dia da ressurreição pudessem se levantar e cair nos braços um do outro.

Os suntuosos túmulos de pedra branca dos trágicos amantes podem ser visitados no mosteiro de Santa Maria de Alcobaça. Sobre o de Pedro, está escrito que os dois permanecerão juntos “até o fim do mundo...”.


Jaz no Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça.
CRONOLOGIA

1320
Nasce o infante Pedro, filho do rei Afonso IV

1336
Pedro casa-se com dona Constança



1344
Afonso IV manda Inês de Castro para o exílio, para dar fim ao caso extraconjugal dela com Pedro




1345
Dona Constança morre no parto. Viúvo, Pedro assume seu romance com Inês


Em 1347, Inês deu à luz ao primeiro de quatro filhos com o infante. 

1355
Três assassinos enviados por Afonso IV matam Inês de Castro no dia 7 de janeiro. Depois de saber da morte da amada, Pedro lidera uma revolta contra o rei. A guerra entre pai e filho termina com um acordo, em agosto do mesmo ano



1357
Afonso IV morre e Pedro assume o poder em Portugal



1360
Pedro declara ter se casado secretamente com Inês de Castro, legitimando assim seus quatro filhos, e transporta o corpo da “rainha morta” para o mosteiro Real de Alcobaça


1367
Morte de Pedro I. Sua tumba é colocada de frente para a de Inês

UMA IMPRESSIONANTE DESCENDÊNCIA

Os nascidos do amor de Inês de Castro e Pedro I se espalharam pelas casas reais européias, o que levou o pesquisador Jorge de Sena a constatar que, na virada do século XV para XVI, “a maior parte da Europa coroada descendia de Inês”.



Uma das filhas do romance, a princesa Beatriz (1347-1381), casou com um filho bastardo do rei de Castela, chamado Sancho de Albuquerque (1339- 1374). Leonor Urraca (1374-1435), filha do casal e neta de Inês, virou esposa de d. Fernando (1380-1416), o poderoso rei de Aragão, Sicília, Nápoles, Valência e Maiorca.

A partir daí, a lista de descendentes de Inês de Castro se torna mais impressionante. Por volta de 1500, passa a incluir o imperador da Germânia Maximiliano I (1459-1519) e d. Manuel I (1469-1521), que reinou em Portugal durante as descobertas marítimas.



O trovador Garcia de Rezende viu nisso uma vitória póstuma de Inês. Pelo sucesso dos frutos da sua relação com Pedro, ela teria vencido o trágico destino, porque o amor daria “galardão” (recompensa). Concluía o poeta, como conselho para as jovens do século XVI:                                      “Não deixe ninguém de amar”.
                                                            
Tumbas de Inês de Castro e Pedro I, esculturas em pedra, escola portuguesa, Século XIV, Santa Maria de Alcobaça, Estremadur
 Almas Gemeas
                            Almas Gemeas Auxilioemocional      
  
Casal real: a arte tumular  união  em vida, tumulos juntos na morte.


              
 
Amor Eterno



Te amei de tantas maneiras e de tantas formas... 
de vida em vida, de época em época, sempre... 
Meu coração enfeitiçado fez uma e outras vezes 
um colar de canções que tomas-te como um presente 
e usaste em torno de teu pescoço, do teu jeito 
e de tantas formas.... 
de vida em vida, de época em época, sempre...


Onde quer que escute as velhas histórias de amor, 
sua antiga dor e esse velho conto de estar juntos ou separados, 
me detenho e uma vez ou outra, olho o passado 
e ao final de tudo, emerge você, 
revestida com a luz de uma estrela polar 
trespassando a escuridão do tempo, 
e deste modo te convertes em uma imagem 
que recordarei para sempre.

Tu e eu flutuamos ali, na corrente que flui 
de um coração cheio de amor, um pelo outro. 
Jogamos o amor ao lado de milhões de amantes, 
compartilhamos a tímida doçura do primeiro encontro, 
as mesmas lágrimas de angustia em cada despedida. 
O velho amor...que se renova uma ou outra vez, 
Sempre... 

Hoje este amor está a teus pés, encontrou sua morada em ti. 
Esse amor, o amor cotidiano de todos os homens, 
o amor do passado, o amor de sempre... 
o regozijo universal, a dor universal, a mesma vida, 
a memória de todos amores, 
as canções de todos os poetas do passado e de sempre 
se fundem neste Amor que é o nosso. 

Rabindranath Tagore 
de "Amor Eterno"
Poeta Indú 1861-1941 

Premio Nobel de Literatura

Fontes:wikipedia/Internet/livros historicos 



Voa minha ave
Voa sem parar
Viaja pra longe
Te encontrarei
Em algum lugar
Permaneço em ti
Como sempre fui
Mais perfeito e mais fiel
Mesmo sozinho sei que estás perto de mim
Quando triste olho pro céu...

Quando eu te vi o sonho aconteceu
Quando eu te vi meu mundo amanheceu
Mas você partiu sem mim
E sei que estás em algum jardim
Entre as flores...

Anjo meu tão amado anjo
Bem sei que estás
E eu do brando sono hei de acordar
Para os teus olhos ver uma vez mais
O verdadeiro amor espera uma vez mais

Quando eu te vi o sonho aconteceu
Quando eu te vi meu mundo amanheceu
Quando eu te vi o sonho aconteceu
Quando eu te vi meu mundo amanheceu

Mas você partiu sem mim
E sei que estás em algum jardim
entre as flores




A Coroação de Inês de Castro em 1361 (c. 1849), por Pierre-Charles Comte.

O LIVRO DE MIRDAD


O LIVRO DE MIRDAD
Autor: Mikhaïl Naimy

.:

 O Amor é a Lei de Deus. 
Viveis para que aprendais a amar. 
Amais para que aprendais a viver. 
Nenhuma outra lição é exigida do homem.

Sou tua criança, ó Senhor,
e esta terra bela, rica e abundante,em cujo seio me puseste para dormir,
é somente o berço de onde
engatinho para ti.

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Não há na minha boca julgamento, e sim a Sagrada Compreensão. Não vim para julgar o mundo, antes foi para desjulgá-lo, pois só a Ignorância gosta de vestir a beca e o capelo, expor a lei e aplicar as penas.
O mais impiedoso juiz da Ignorância é a própria Ignorância. Consideremos o Homem. Não tem ele, na ignorância, se dividido em dois, atraindo assim a morte para si, bem como para todas as coisas deste seu mundo dividido?
Em verdade vos digo, não há Deus e Homem, mas sim Deus-Homem ou Homem-Deus. Só há o UM. Não obstante multiplicado, não obstante dividido, é para sempre UM.
A unicidade de Deus é a eterna lei de Deus. É uma lei que por si se cumpre. Não há necessidade de cortes de justiça nem de juizes que o proclamem e sustentem a sua dignidade e a sua força. O Universo - o visível e o invisível - é uma só boca a proclamá-lo para aqueles que tem ouvido para ouvir. Não é o Mar - conquanto vasto e profundo - uma só gota?
Não é a Terra - conquanto lançada tão longe - uma só esfera?
Não são as esferas - conquanto tão numerosas - um só universo?
Também a humanidade é um só Homem. Semelhantemente, o homem, com todos os seus mundos, é uma unidade completa.
A unicidade de Deus, meus companheiros, é a única lei do Ser. O Outro nome que se lhe dá é Amor. Sabê-la e nela habitar é habitar na Vida. Mas habitar em qualquer outra lei é habitar no não-ser, ou seja, na Morte.
A Vida é colher. A Morte é espalhar. A Vida é ligar. A Morte é desligar. Eis porque o Homem - o dualista - está suspenso entre as duas, pois ele colhe, mas somente espalhando. E ele liga, mas somente desligando. Ao colher e ligar, ele guarda A Lei, e a sua recompensa é a Vida. Ao espalhar e desligar, ele peca contra a Lei, e a sua amarga recompensa é a Morte.
Ne entanto, vós, auto-condenados, sentai-vos para julgar os homens que já estão, como vós, auto-condenados. Que horríveis juizes e que horrível julgamento! Menos horrível seria dois sentenciados, cada qual condenando o outro às galés.
Menos ridículo seria dois bois no jugo, cada qual dizendo ao outro: "eu o poria no jugo".
Menos macabro seria dois cadáveres numa cova trocando entre si condenações à cova. Menos digno de compaixão seria dois cegos a arrancarem mutuamente os olhos.
Evitai sentar-vos na cadeira do julgamento, meus companheiros, pois para pronunciardes um julgamento contra alguém ou alguma coisa, não somente deveis conhecer a Lei e viver de acordo com ela, mas também ouvir o testemunho. E a quem ouvireis como testemunha em qualquer caso que se apresente?
Chamareis o vento para depor em juízo? Pois o vento auxilia e instiga qualquer ocorrência debaixo do céu.
Ou citareis as estrelas? Pois elas estão a par de tudo que sucede no mundo.
Ou enviaríeis intimações a todos os mortos desde Adão até hoje? Pois todos os mortos estão vivendo nos vivos.
Para ter um depoimento completo em qualquer caso, o Cosmo, precisa ser a testemunha. Quando puderdes levar o Cosmo à corte, não necessitareis de cortes. Descereis da cadeira de juiz e deixareis que a testemunha seja o juiz.
Quando conhecerdes a todos não julgareis ninguém.



Do reflexo à luz



"A meta da vida humana é conhecer isto, "tornar-se participante da vida divina"Mas como? 
Chega um momento em nossas vidas em que não podemos mais contentar-nos com ideias gerais. Temos necessidade de sermos guiados concretamente, no desenrolar de nossas experiências. Na tradição hesicasta, como em todas as grandes tradições, insiste-se nesta transmissão de pessoa a pessoa, "de meu coração ao teu coração". 

O espelho no qual podemos discernir a qualidade ou ilusão de nossos atos, não é uma lei ou uma regra, mas uma pessoa. 

A compreensão e o amor de Deus se transmitem pelo olhar, cuja ciência nos esclarece e cuja experiência nos reconforta. (...)

Filocalia quer dizer literalmente "amor à beleza". 


A oração é a arte pela qual a pessoa se une à Beleza última, cujos reflexos são a natureza, os corpos ou os rostos.


Orar é ir do reflexo à luz ou voltar da luz venerando-a em seus reflexos. Se quisermos resumir em algumas palavras, podemos dizer: 

Assenta-se.
Cala-te.
Permanece só.
Respira suavemente.
Faz descer tua inteligência ao coração.
Na respiração invoca o Nome.
Abandona os pensamentos.
Sê paciente e repete muitas vezes este exercício. (...)

Assenta-se, em primeiro lugar, isto se refere a postura, à atitude correta; (...) Sem estar impaciente ou indolente, numa atitude de repouso e ao mesmo tempo vigilância.(...)

A maneira correta de sentar-se é aquela que nos permite permanecer mais tempo possível imóveis e sem fadiga, de modo que a imobilidade do corpo favoreça a do espírito, mesmo se, num primeiro momento, o espírito se agite. Daí a importância de perseverar nesta imobilidade.

Assenta-te, no nível psicológico quer dizer: reecontrar com sua base; permanece numa atitude de estabilidade e de equilíbrio; como estar em seu estado natural, que significa o estado de uma pessoa em harmonia consigo mesma.


Num sentido mais espiritual, o assento, a base é a permanência, aprender a permanecer em Deus, permanecer nele, como ele permanece em nós. Permanecer em seu Amor, ter sua morada, sua sede, sua raiz nele, em todo tempo em todo lugar...


Cala-te. Silencio dos lábios, silencio do coração, silencio do espírito, três degraus em que, de silencio em silencio a pessoa se aproxima do silencio infinito da Presença.


Respira mais suavemente. Não se trata de controlar a própria respiração, nem de medi-la, mas antes, de acompanhá-la, de acalmá-la, de suavizá-la... Hoje já conhecemos mais a influencia da respiração sobre o psiquismo, a atenção ao respirar é um meio seguro de concentração, pensamos de modo diferente quando o respirar é calmo e profundo. Aliás, num momento de supressão da respiração, o pensamento também é suspenso, provamos um certo silencio.

De onde vem nosso sopro, e para onde retorna? Ser atento ao "inspirar" e ao " expirar" já pode nos levar bem longe, mas para a tradição hesicasta a atenção ao respirar é verdadeiramente um exercício espiritual.

O respirar é a Ruah, o hálito de Deus, o pneuma, o Sopro do Pai, que traduzimos por Espírito Santo. Respirar profundamente, respirar mais docentemente é aproximar-se do Espírito de Deus e, num certo momento, sentir-se inspirado, expirado por Ele. A pessoa pode sentir-se como que levada pelas grandes ondas do Vivente: "Ele dá seu sopro as coisa e elas vivem...Ele retira seu sopro e elas voltam ao pó." (...)


Gregório de Sinaíta dizia: O verdadeiro princípio da oração é o calor do coração que consome as paixões, produz na alma a alegria e a felicidade e conforma o coração num amor seguro e num sentimento de plenitude indubitável.


Simone Weil, nos fala que "a imaginação serve para fechar os buraco por onde passaria a graça". Temos dificuldade de suportar o vazio, o deserto e o povoamos de miragens.


"O que os monges buscam não é um estado subjetivo particular, mas um contato objetivo cujos efeitos - calor do coração, felicidade, sentimento de plenitude - são reais, mas essencialmente diferentes dos sentimentos subjetivos que lhes correspondem, pois manifestam a presença efetiva de Deus e não um estado de alma" - Gregório Palamas. (...)


Tem um coração e serás salvo. 

Ter um coração não é somente centrar-se numa parte do corpo, é uma certa maneira de ser, de ver, de respirar com o coração. O próprio do coração é tratar todas as coisas fraternalmente, viver num mundo de objetos, mas como meta este despertar do coração, esta sensibilidade à presença de Deus em todas as coisas, e esta presença faz de todas as coisas não fenômenos no sentido comum, mas verdadeiras epifanias, manifestações do Deus inacessível. 

A oração de Gregório exprime bem este estado do coração despertado quando diz: "Ó Tu, o Além de Tudo". 


Tu - sensação de intimidade, de presença e Além de Tudo, sentido de alteridade, da Outridade radical daquele ao qual ele se dirige. O coração reconhece o Desconhecido no próximo e a proximidade do Além, sentido da Imanência e da Transcendência.


Ter um coração é estar centrado, sair da dispersão do mental dos pensamentos que vão e vem. O coração tem uma função de integração da personalidade - integrar a função vital e a função intelectual - daí esta experiência de "fazer descer o intelecto ao coração". 


Pacificá-lo, centrá-lo, fazer do coração o próprio órgão da consciência não racionante, mais intuitiva que analítica, percepção global dos seres das coisas em que seu caráter fugaz e eterno ao mesmo tempo, percepção amante, que permite ver melhor o que é. 


Esta descida do espírito ao coração, é um ato de integração, um modo de centrar o pensamento de cordializar a consciência; Nós nos aproximamos do coração de Cristo e de seu olhar não julgador, sobre todos aqueles que Ele encontra.

Jean Yves Leloup 
em Escritos sobre o Hesicaste.